O despertador tocava às 7 da manhã para ter tempo de fazer tudo calmamente antes de mais alguém se levantar. No mesmo quarto dormiam duas raparigas da Letónia. Ficámos em casa de uma família incomum mas acolhedora: um casal metade croata, metade japonês, com duas crianças e uma avó. Em menos de dez minutos a pé estávamos no Eko Centar, às 8h, para uma grande mesa de pequeno almoço que dava início a um dia de trabalho. Éramos 14 voluntários de 9 países europeus e, apesar das diversidades, um grupo agradável. Fazíamos um círculo grande, na relva, todas a manhãs, onde todos tinham oportunidade de expressar qualquer problema, ideia ou agradecimento, e depois distribuíamos tarefas e fazíamos jogos para um arranque mais energético. As actividades variaram bastante: ajudar a comunidade, trabalhar com crianças, jardinagem, culinária, organizar um festival, armazenar milho, transportar madeira, eco-construção, trabalhos manuais, caminhadas, entre muitas outras. Também aprendemos imenso, e tivemos momentos dedicados a aulas e debates sobre permacultura, desperdício zero, Croata, ginástica Bothmer, public speaking, feminismo e outros temas importantes e interessantes: alguns organizados pelo centro, outros pelos voluntários. Por norma, durante as manhãs fazíamos trabalhos mais físicos, às 13 almoçávamos (tínhamos a melhor cozinheira vegetariana de sempre), tirávamos um par de horas para a siesta e voltávamos a trabalhar ou a ter workshops até à hora de jantar. Por vezes sentávamos à volta da fogueira a seguir ao jantar, outras convivíamos no espaço dos voluntários, outras ainda tínhamos noites culturais em que cada país cozinhava e fazia uma apresentação e jogos ou danças. Aproveitámos as folgas para viajar juntos: fomos até à Bósnia, passeámos pela costa da Croácia e alguns visitaram também a Hungria. Estávamos sempre em movimento e, no entanto, senti-me sempre muito tranquila, em harmonia com o espaço e as pessoas que me rodeavam. Houve momentos difíceis, desafios sociais e pessoais e um par de dores de barriga, mas cada um contribuiu diferentemente para o total da experiência. Foi assim durante dois meses em Latinovac, uma aldeia no interior da Croácia que consistia quase apenas numa estrada ao longo da qual se estendiam casas. Recomendo vivamente o voluntariado numa aldeia pequena. Sinto que num espaço mais familiar e menos caótico as aprendizagens se absorvem melhor, por estarmos sempre no mesmo ambiente e com as mesmas pessoas e não haverem tantos pontos que nos divirjam a atenção. Para além disto, a aldeia ganhou vida com a nossa presença e acho que é importante dinamizar estes locais que tendem a ter cada vez menos população. Já tinha feito Erasmus antes, mas esta experiência foi completamente diferente, muito mais próxima e concreta. Estávamos lá para aprender e trabalhar sobre o ambiente e a comunidade e sinto que ganhei imenso nessa área em que queria desenvolver conhecimentos e práticas. Nem tudo o que fazemos tem de ser super útil para a nossa vida profissional: neste caso, sinto que ganhei imenso a nível pessoal, que me tornei uma pessoa mais consciente, desembaraçada e segura. Descobri mais sobre como quero ser, como trabalho melhor e as metas e condições que são importantes para mim. Foi a minha primeira experiência de voluntariado internacional e não podia sentir-me mais realizada com ela. Encontrei nela parte de mim, pessoas fantásticas e uma forma de viajar, conhecer e contribuir que se distingue pela plenitude. Acabei a Licenciatura e estava a trabalhar numa loja de brinquedos. Na segunda década de vida, os verões têm-se dissolvido em trabalhos rotineiros e por isso queria fazer algo importante e não “perder” o verão. Não poderia ter feito melhor escolha, porque ganhei muito mais do que poderia ter imaginado. Deixo com este texto uma paixão pelo voluntariado engrandecida e a minha saudade e gratidão para com a ProAtlântico e para com as pessoas maravilhosas que me acompanharam – a equipa do Eko Centar, os voluntários e outros mais com quem cruzei caminho.