À chegada fui recebida pelo frio, dando-me de ínicio logo uma certa suspeita da temporada que me viria a confrontar nos meses de Inverno. No entanto, pouco tempo me foi dado para pensar no que aí vinha… A colega que me recebeu no aeroporto era a euforia e simpatia em pessoa, convidativa e incrivelmente prestável. Insistiu na compra de novos itens para o meu quarto e convidou-me para aquele que seria o meu primeiro almoço na Alemanha. Para a minha surpresa, à medida que fomos entrando pela cidade, avistei de imediato o Schloss Johannisburg – o local do meu projecto – e sabia que estava na minha nova casa. O apartamento, para onde fui totalmente às cegas, foi uma bela surpresa, incluíndo um espaço gigante e confortável, o meu quarto! Felizmente, especialmente pelas saudades que muitas vezes apertam ao fim do dia, vivo com a Duygu, uma rapariga turca e já bastante amiga, também voluntária num projecto SVE em Aschaffenburg. O primeiro dia acabou por ser arrebatador, com as emoções à flor da pele, umas tristes despedidas e a partida de Portugal, ainda muito presente. Na primeira manhã, depois de uma longa e desorientada caminhada (na qual me perdi por uns “breves” momentos), cheguei ao sítio certo. A primeira entrada no Schloss Johannisburg foi uma lufada de ar fresco e inspirador – e assim continua a ser realmente todos os dias da semana, faça chuva ou faça sol, façam 13° C ou -3° C... A melhor comparação seria o castelo d “A Bela e o Monstro”, ainda que sem maldições nem objectos falantes. Comecei por conhecer os cantos à casa, sendo o meu principal local de trabalho o escritório, biblioteca e estúdio fotográfico na “Museumsverwaltung”, onde se reúne a equipa responsável pelas áreas de administração, gestão, investigação, divulgação e todos os assuntos e preparativos relativos à concepção de uma exposição de arte. Parte da equipa do museu fazem uma restauradora, historiadores, arqueólogos, conservadores, museólogos, fotógrafas (incluíndo-me a mim agora durante o projecto!), técnicos, voluntários científicos, estagiários... Apesar da minha principal função, na área de fotografia, acontecer no museu do “Schloss”, tanto a equipa como eu trabalhamos para a rede de museus da cidade – os “Museen der Stadt Aschaffenburg” –, participando em várias actividades e pontos culturais da cidade, assim como estando em constante comunicação com os vários museus. A equipa é um grupo pequeno e muito familiar, tendo a minha integração sido practicamente instantânea... Assim, mesmo muito inesperadamente, ao invés de uma voluntária europeia, sinto-me a filha de uma família que muito gosta de me perguntar se estou bem ou se preciso de alguma coisa! À medida que as semanas foram passando, criei laços de amizade e encontrei nos meus colegas um bom apoio para os pequenos e grandes problemas que uma voluntária pode enfrentar! Como projecto principal, trabalho em conjunto com a fotógrafa do museu, apoiando-a em diversos projectos paralelos, alguns de curta e outros de longa duração. Fotografo também individualmente, com frequência no interior e no estúdio fotográfico, eventos relativos aos museus da rede, inaugurações, espaços de exposição e peças museológicas. No exterior, mais ocasionalmente, os assuntos de interesse são arquitectónicos, edifícios históricos da cidades, igrejas e os próprios museus. Em pararelo e com grande dedicação, faço trabalho de pesquisa e inventarização, ligado a um tipo de fotografia específica – fotogramas – de Christian Schad, um conhecido e multifacetado artista da cidade de Aschaffenburg. Apesar de gostar de tudo o que faço no meu projecto, esta é sem dúvida a minha tarefa preferida, não podia de todo ser mais indicado para a minha área de interesse! Apoio o resto da equipa noutras actividades mais pontuais, como a preparar exposições, a fazer certas tarefas de pesquisa e a entregar/recolher peças de arte – ideal para conhecer os artistas. Desta forma, todos os dias são bastante diferentes e, ainda assim, um enorme prazer, com dias por vezes bastante preenchidos onde nem páro um minuto, e outros ligeiramente menos excitantes onde passo o dia sentada no escritório! No entanto, ao fim do dia sinto que tudo o que faço é produtivo e, de certa forma, contribuo para a documentação e desenvolvimento cultural da cidade, na qual o museu participa activamente. O contacto com a cultura e com a língua é curioso, pois dada a minha origem e fluência em alemão não enfrento dificuldades em comunicar no dia-a-dia, mas vou ganhando uma percepção das particularidades do povo alemão. Os habitantes são cordiais e hospitaleiros, e embora nunca demasiado próximos, nunca me sinto uma pessoa anónima e vou reconhecendo as mesmas pessoas todos os dias pelas ruas. As amizades demoram o seu tempo – não é de todo assim tão fácil para projectos onde se é o único voluntário e a única pessoa com 20 e poucos anos – mas à medida que fui conhecendo a cidade, os pontos de encontro, locais de concertos, também conheci pessoas com quem me divertir, curiosamente na sua grande maioria igualmente estrangeiros, estagiários e ex voluntários! Descobri uma oferta cultural enorme para uma cidade de 60000 habitantes, dou por mim a passar uma grande parte do meu tempo livre em concertos e até comecei a ter aulas de bateria – era preciso sair de Portugal para começar a experimentar algo novo...! À semelhança de outros projectos de SVE de longo prazo, participei num seminário de “On arrival training” na pequena cidade Weil der Stadt, onde passei sem dúvida os melhores dias desde que pus os pés na Alemanha. O grupo não podia ser mais variado, com voluntários vindos da Grécia, Moldávia, França, Ucrânia, Rússia, Geórgia e três de Portugal. Durante 10 dias, sob orientação de duas colegas da organização VIA, seguimos em grupo uma planificação de uma série de actividades, desde simples jogos de palavras, gestos concentração e coordenação, a apresentações criativas dos nossos projectos, exercícios de confiança, desporto, passeios pela floresta e rallys pela cidade. Uma inesperada união surgiu apenas um ou dois dias depois da chegada, com o grupo a formar uma enorme amizade, em parte incentivada pelas actividades propostas pelas nossas orientadoras, mas principalmente por todas as conversas, temas e opiniões, partilha e personalidades distintas e ainda assim muito abertas... A despedida foi estranhamente muito difícil, com o grupo enriquecido mas triste com o fim daquilo que foi para a maioria um período de grande importância. Ficou a ideia de não ser qualquer um que deixa a sua vida para trás e parte para a aventura! O seminário foi um ponto de viragem no meu projecto, reflecti, ganhei muita força, inspiração, perspectivas e ferramentas muito úteis para a minha estadia na Alemanha e acima de tudo para a vida. Sandra Pascoal